O deputado Assis Melo, do PCdoB do Rio Grande do Sul, conseguiu aprovar,
na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, proposta
de emenda constitucional que restaura o artigo 170, da Constituição
Federal de 1988. É o dispositivo que define o que é empresa brasileira e
o que é empresa nacional, distinguindo ambas das empresas estrangeiras e
multinacionais.
Nem todos se lembram, hoje, da Comissão de Estudos Constitucionais que,
sob a presidência do professor Afonso Arinos, elaborou proposta de
anteprojeto da Constituição de 1988. Poucos – e sou um dos privilegiados
– têm em seu poder o texto entregue solenemente ao Presidente Sarney,
em 1986. Nele se encontram os dispositivos mais importantes que os
constituintes acolheriam no documento a que Ulysses Guimarães deu o nome
de Constituição Cidadã.
Como membro daquele grupo - e pelo dever de ofício, por ter sido seu
secretário executivo - registro que a defesa do interesse nacional
prevaleceu, e de longe, nas discussões e na redação final do
anteprojeto. E entre os mandamentos que propúnhamos, houve um contra o
qual ninguém se opôs, ainda que houvesse entre nós conservadores
notórios e empresários associados a empreendedores estrangeiros.
Trata-se do artigo 323, de nossa proposta, assim como foi redigido, por
Barbosa Lima Sobrinho e aprovado por todos:
“Só se considerará empresa nacional, para todos os fins de direito,
aquela cujo controle de capital pertença a brasileiros e que,
constituída e com sede no País, nele tenha o centro de suas decisões”.
Os constituintes partiram da sugestão de Barbosa Lima Sobrinho e
aprovaram os seguintes dispositivos, no texto original, de 5 de outubro
de 1988:
“Art. 171. São consideradas:I - empresa brasileira a constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no País;II - empresa brasileira de capital nacional aquela cujo controle efetivo esteja em caráter permanente sob a titularidade direta ou indireta de pessoas físicas domiciliadas e residentes no País ou de entidades de direito público interno, entendendo-se por controle efetivo da empresa a titularidade da maioria de seu capital votante e o exercício, de fato e de direito, do poder decisório para gerir suas atividades.§ 1º A lei poderá, em relação à empresa brasileira de capital nacional:I - conceder proteção e benefícios especiais temporários para desenvolver atividades consideradas estratégicas para a defesa nacional ou imprescindíveis ao desenvolvimento do País;II - estabelecer, sempre que considerar um setor imprescindível ao desenvolvimento tecnológico nacional, entre outras condições e requisitos:a) a exigência de que o controle referido no inciso II do caput se estenda às atividades tecnológicas da empresa, assim entendido o exercício, de fato e de direito, do poder decisório para desenvolver ou absorver tecnologia;b) percentuais de participação, no capital, de pessoas físicas domiciliadas e residentes no País ou entidades de direito público interno.§ 2º Na aquisição de bens e serviços, o poder público dará tratamento preferencial, nos termos da lei, à empresa brasileira de capital nacional”.
Em obediência ao Consenso de Washington, uma das primeiras iniciativas
do governo entreguista e antinacional de Fernando Henrique Cardoso foi a
de promover, em agosto de 1995 – oito meses depois da posse – a
supressão do artigo 170, acima transcrito, e que definia o que se
poderia considerar empresa brasileira e empresa nacional. Com isso,
qualquer empresa que se organizasse no Brasil, como tantas o fizeram, e
continuam a fazer, como subsidiária de sua matriz estrangeira tem o
mesmo tratamento das empresas realmente nacionais.
O então presidente abria caminho, com essa emenda, para o crime maior, o
da privatização das empresas públicas. Com criminoso cinismo, as
empresas estrangeiras que adquiriram o controle das empresas estatais
brasileiras foram financiadas com o dinheiro do FAT (Fundo de Amparo aos
Trabalhadores) administrado pelo BNDES. A primeira providência dessas
empresas foi o da “reengenharia” administrativa, com a demissão de
milhares de trabalhadores. Eles haviam financiado, com o FAT, a sua
própria miséria.
Com o desastre que o neoliberalismo provocou no mundo e atinge agora os
países centrais que supunham ganhar com a globalização, o Congresso tem a
sua oportunidade de se redimir da vergonhosa capitulação de há 17 anos.
O momento é favorável a que a emenda do deputado Assis Melo tenha
trâmite rápido no Congresso, para que não ocorra, de novo aqui o que
está ocorrendo com os povos europeus. É também um teste para a maioria
parlamentar e para o próprio governo. Se a emenda do parlamentar gaúcho
for rejeitada, o grande vencedor virá a ser o agente ostensivo, no
Brasil, da ordem neoliberal – Fernando Henrique Cardoso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
”Sendo este um espaço democrático, os comentários aqui postados são de total responsabilidade dos seus emitentes, não representando necessariamente a opinião de seus editores. Nós, nos reservamos o direito de, dentro das limitações de tempo, resumir ou deletar os comentários que tiverem conteúdo contrário às normas éticas deste blog. Não será tolerado Insulto, difamação ou ataques pessoais. Os editores não se responsabilizam pelo conteúdo dos comentários dos leitores, mas adverte que, textos ofensivos à quem quer que seja, ou que contenham agressão, discriminação, palavrões, ou que de alguma forma incitem a violência, ou transgridam leis e normas vigentes no Brasil, serão excluídos.”